A enchente é o avanço dos corpos d'água e a elevação excessiva do nível do escoamento pluvial superficial, um grave problema num ambiente urbano, onde, quase que por via de regra, não existe a preocupação com a sustentabilidade, desde a criação dessas cidades até a sua constante e desordenada expansão. A enchente favorece a proliferação de doenças, espalha lixo pela cidade, promove o assoreamento de corpos d'água e a erosão de relevos, inutiliza construções, destrói o mobiliário urbano, veículos automotores etc. Mas, de onde surge este fenômeno tão anti natural?
Bom, para começar, ele não é tão anti natural assim. Pense por exemplo nas primeiras aulas de história, onde as crianças aprendem a importância que o Nilo teve pra titânica sociedade Egípcia antiga. Como esse povo conseguiu sobreviver em meio ao deserto? Devido aos ciclos de cheia e seca do Rio Nilo. Que variava o seu leito e deixava em suas margens uma camada fértil de húmus (matéria orgânica) que favorecia a agricultura e alimentava a população por todo o ano. E fica a pergunta: Porque os egípcios se favoreciam das enchentes, e nós, brasileiros sofremos tanto? Parte dessa diferença, vem no modo como as cidades brasileiras e os povoados egípcios - ou quaisquer outros, como os da mesopotâmia antiga – lidam ou lidavam com esse fenômeno.
A cidade moderna, normalmente não planejada, é construída de forma a isolar o homem do ambiente. O que era antes um abrigo da intempérie tornou-se hoje uma bolha onde o mundo natural, selvagem e indomado, fica de fora, e se possível, coberto. Diferentemente dos povos que vivam do regime dos rios, o Brasileiro enxerga a natureza como algo a ser “domesticado” para que haja o progresso. O homem do primeiro mundo não pode ir para o trabalho pisando na terra. Com isso, a cidade isola a natureza em vez de absorvê-la, e faz faltar uma certa sinergia, para que as coisas convivam em vez de competir. O resultado catastrófico disso é que, por mais avançada que a tecnologia do homem esteja, ela nem sempre consegue conter a força da natureza, e quando esse choque ocorre, quem não está preparado sai por baixo (d'água).
Do ponto de vista da água, a cidade é uma placa impermeável no meio do continente repleta de bolhas impermeáveis e alguns sulcos canalizados. A tendência óbvia é que toda a água que banhe o solo corra para esses sulcos rapidamente saturando-os. Numa situação natural de floresta, a chuva já é menos intensa à medida que grande parte da água fica contida num colchão úmido de ar abaixo das copas das árvores, e não chega a formar grandes nuvens de chuva em grandes altitudes. Mesmo assim, eventualmente vem a chuva. Parte dela é atrasada por um sinuoso caminho de pingadeiras, de folha em folha até o solo, que absorve e contém uma enorme parcela da pluviosidade. O que não é retido é drenado pela superfície, carregando alguns materiais para os corpos sinuosos de água, que encharcam as adjacências e nutrem um micro ecossistema adaptado à variação – ecossistema esse que segura o solo marginal e impede o assoreamento do corpo d'água -. A floresta se adapta à chuva, à enchente, funciona em conjunto. E por isso não sofre, se enriquece. A cidade não tem tanta sorte, visto que se isola.
A solução para o sofrimento com as enchentes é simples: Não combater as enchentes, mas aprender a conviver com elas. Fazer com que elas sejam parte integrante do dia a dia, sem causar danos à população, ou às suas posses. E o jeito de fazer com que isso aconteça é reinventando a cidade, e reinventando a idéia de natureza e de cidade na cabeça de cada um. Para isso é necessário o avanço técnico, a vontade política e a conscientização da população. A mudança precisa ser natural e não forçada. As pessoas precisam QUERER que as coisas mudem, e para isso precisam entender o problema.
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